sexta-feira, 14 de maio de 2010

A Deus Saldanha Sanches


Foi com muita tristeza que vi partir um grande homem de esquerda e defensor da liberdades de expressão (nós últimos anos travava uma grande luta contra a corrupção em Portugal) muito antes do 25 Abril, e que conheci pessoalmente.
Com ele travei várias lutas no MRPP,as minhas sinceras condolências à família e amigos mais próximos.


"O velório realiza-se amanhã, Sábado, a partir das 14h00, na Igreja de S. João de Deus (Praça de Londres)".

"Será cremado no Domingo, pelas 15h00, no Cemitério dos Olivais (Crematório), saindo da Igreja de S. João de Deus pelas 14h30".

Um dos artigos do Prof. Saldanha Saches. Agradeço "Jornal Expresso" vou tomar a liberdade de o transcrever na integra.


"Manuel Alegre denunciou o PEC, que mais uma vez vai atirar o peso da
crise para os alvos habituais. Fez bem, mas omitiu o essencial.
O PEC é a factura que vamos pagar por anos e anos de saque organizado
e contínuo dos recursos públicos, por uma vasta quadrilha pluripartidária
que vive de comissões, subornos e tráfico de influências. As
derrapagens, sempre as derrapagens…
Tudo isto é velho e tem raízes fundas. Não podemos é deixar de recordar
a responsabilidade que este Governo e este PS têm no agravamento da
situação.
Começaram por pôr Alberto Costa na justiça. Nomearam Ricardo
Rodrigues para porta-voz nesta área. Conseguiram tornar ainda mais
labiríntico o Código do Processo Penal. Deram todos os sinais ao mercado
da economia paralela de que os ventos eram de feição.
Guardar um respeitoso silêncio nesta matéria não é hipocrisia, é
cumplicidade activa. Atacar o PEC (e o economicismo, um conceito tão
vazio como a cabeça dos que o utilizam) é fácil. Mas não chega.
A principal razão dos ataques de João Cravinho à corrupção é a
percepção que este tem há muito de que, com este nível de esbulho de
dinheiros, a corrupção no sector público torna totalmente insustentável
qualquer ideia de que este possa ter um papel na economia, se não
determinante, pelo menos complementar.
Para o Bloco de Esquerda, estas questões são secundárias. O capitalismo é
a própria expressão encarnada da corrupção e das malfeitorias. Contudo,
se pensarmos de forma diferente, nenhum candidato que queira assumir
de forma séria os reais problemas do país e que não aceite facilmente os
trinta dinheiros que compram tudo e todos não pode enfiar a cabeça na
areia e fingir que a corrupção, ao nível que atingiu, é apenas mais um dos
problemas do país.
Um candidato sério tem que ter o saque da res publica no centro da sua
agenda política. Tem que ter coragem para enfrentar aquela frente tão
difusa como bem estruturada que consegue fazer da corrupção uma
questão sobre a qual se desliza sem grande atrito e sem consequências –
pode eventualmente abordar-se o tema, mas rapidamente o discurso
desliza dessa para outras questões.
Corremos o risco trágico de ter candidatos a atirar impropérios à
ganância dos especuladores internacionais, mantendo um silêncio
cúmplice sobre os métodos de gestão da coisa pública que nos deixaram
indefesos e impotentes nas suas mãos.
Sabemos que o problema tem as mais variadas faces. Podemos mesmo
esperar que da Comissão de Acompanhamento da AR saiam algumas
propostas consensuais. Aprová-las será para alguns membros da mesma
Comissão, não o proverbial ingurgitamento de sapos, mas de tartarugas.
Ficar calado, refugiar-se em minúcias técnicas, andar de braço dado com
os fautores públicos e notórios da corrupção tem que ter um preço. E esse
preço é a assunção pública e expressa de que se trata de um candidato de
um regime apodrecido. Por isso, para Alegre a opção é clara: ou procura
o apoio das quadrilhas que nos roubam impunemente, ou guarda um
silêncio cúmplice e envergonhado a troco de meia dúzia de votos, ou
toma sobre a corrupção uma posição digna e inequívoca.

* Artigo publicado no jornal “Expresso”, de 10.4.2010

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